quinta-feira, 24 de maio de 2007
DÁ QUE PENSAR! (II)
Em primeiro lugar quero endereçar os meus parabéns ao Rui Ferreira pela forma frontal como expôs as suas dúvidas. Dá que pensar? Dá mesmo, o bem-estar, satisfação e alegria das crianças até porque o termo minibásquete é um conceito muito vago, heterogéneo e extenso, que é abordado de múltiplas perspectivas. Para mim são todas válidas, desde que o principal desta actividade seja a criança o seu crescimento e desenvolvimento; e quando digo criança quero dizer todas as crianças, não apenas as que no momento se apresentam como as mais aptas.
Por minibásquete podemos, entre outros conceitos, entender esta actividade como um movimento de fomento da prática desportiva, que tem de ser integrador, mobilizador de todas as crianças, pais que as acompanham, treinadores e dirigentes que as enquadram. Mas também podemos encarar como um escalão de formação que visa a captação de praticantes para a modalidade. Quer numa perspectiva, quer noutra, e que fique claro para mim ambas são válidas; o que está em causa, repito, é o bem-estar, satisfação e alegria das crianças Aliás estas perspectivas, não são antagónicas e podem e devem ser complementares.
Em ambas as situações também temos que perceber que o minibásquete é um universo muito grande: Mini -12, Mini -10 e Mini -8, o que corresponde metermos dentro do mesmo conceito um leque tão diferenciado do ponto de vista motor e psicológico, como são as crianças que vão dos 6 aos 12 anos. Mal comparado é como meter dentro do mesmo saco, Juniores B (Sub-18), Cadetes, (Sub-16) e Iniciados (Sub-14) e tratá-los todos da mesma forma.
Responder à questão de deixar ou não roubar a bola depende muito do que é que estamos a falar. Poderia expor vários argumentos a favor, e vários argumentos contra, poderia, o que acho mais correcto, enumerar as situações em que deixo que isso aconteça e situações em que não permito que o mesmo suceda, contudo hoje prefiro relatar uma de muitas histórias pelas quais já passei, e que cada um tire a sua conclusão.
Na época passada fui convidado pelo Galitos do Barreiro para assistir a um Convívio de Minibásquete. A determinada altura estava a assistir a um jogo entre os Minis B do Barreirense e uma equipa muito incipiente, se a memória não me falha da Brincolândia. Após a bola ao ar e o primeiro cesto do Barreirense, verifiquei que os jovens do Brincolândia pura e simplesmente não conseguiam sair debaixo do seu cesto e sempre que repunham ou tentavam repor a bola, esta era imediatamente roubada pelos jovens do Barreirense que se limitavam a marcar mais dois pontos debaixo do cesto. O jogo não passava destas duas acções. Um a tentar repor a bola dois a recuperarem-na e lançarem ao cesto. Achei que não devia limitar-me a assistir ao que estava a observar e abordei os treinadores das duas equipas e perguntei: - “Deixam-me arbitrar este jogo? Atenção que vou ser muito rigoroso no contacto.” Perante a anuência dos dois treinadores chamei os jovens das duas equipas e expliquei como ia arbitrar e que não ia permitir tirar a bola das mãos dos adversários nem permitir contactos.
Comecei a arbitrar e por haver contacto, marquei falta um jovem do Barreirense. Logo a seguir o mesmo voltou a fazer contacto e marquei de novo falta, ao que ele me disse muito zangado: -“Eu assim não jogo.” A minha resposta foi pronta: - “Ainda bem!” e voltei-me para o banco do Barreirense e perguntei, quem é que queria entrar. Apareceram logo vários voluntários de braço no ar. O treinador do Barreirense escolheu um e o jogo continuou.
Os jovens do Brincolândia com estas novas regras já iam conseguindo driblar, progredir no terreno e tentar passar. A maioria das vezes, acabavam por perder a bola. Os jovens do Barreirense, interceptavam as tentativas de passe e saiam, rapidamente em contra-ataque finalizando a maioria das situações ou através de acções individuais ou através de passe. O resultado continuou evidentemente muito desequilibrado a favor do Barreirense, mas o jogo fluiu com os jovens o Barreirense a perceberem em que momento, interceptavam o passe, ou a ganharem o ressalto e a saírem para o contra-ataque. Atenção que a defesa do Barreirense continuou a ser campo inteiro. Os jovens do Brincolândia conseguiram progredir no terreno e ensaiarem alguns poucos lançamentos. Após esta experiência pergunto em que situação do jogo é que os minis do Barreirense e do Brincolândia, aprenderam, mais do jogo? Eu não tenho dúvidas na resposta. Alguém tem?
A grande diferença entre arbitrar basquetebol e arbitrar minibásquete é a seguinte: No basquetebol arbitrar é interpretar as regras do jogo, no minibásquete arbitrar é acima de tudo compreender as dificuldades motoras das crianças. Se queremos ensinar, os professores, treinadores, amigos e árbitros que se prontificam a arbitrar devem ter a sensibilidade de utilizar o “instrumento regras”, como um meio de avaliar cada situação concreta e nunca como um meio abstracto e teórico. Como todos os instrumentos, as regras, não são boas ou más em si, o que as torna boas ou más é o uso que lhes damos.
Para finalizar no minibásquete, e neste universo coabitam, como no exemplo dado, crianças que já jogam há alguns anos e outros que acabam de chegar à modalidade, temos que saber o que é que queremos? Não podemos ter dúvida sobre o que pretendemos. Nestas idades o principal é ensinar, e que as crianças aprendam? Ou vencer jogos pela maior diferença possível? A resposta tem de ser dada por cada um de nós.
San Payo Araújo